A escola de massas, onde um professor ensina ao mesmo tempo e no mesmo lugar dezenas de alunos, nasceu com a revolução industrial mas chegou ao século XXI. Em dois séculos, mudaram os estudantes, mudou a sociedade e mudou o mercado de trabalho.
Quando mudará a escola?
A escola do ano 2000
imaginada pelos ilustradores franceses Jean Marc CotÍ e Villemard em 1899
Crianças sentadas em fila, olhando para a frente. Mãos
cruzadas em cima da mesa, numa postura inerte. A secretária do professor fica
no extremo esquerdo da sala de aula. Não está a ensinar. Os alunos têm uns
capacetes de metal, ligados por uns cabos eléctricos a uma máquina onde o
professor coloca uns livros. A função desse aparelho, compreende-se pela
imagem, é a de extrair a informação dos manuais e introduzi-la directamente nos
cérebros dos jovens, através da transmissão da energia eléctrica. Foi assim que
os ilustradores franceses Jean Marc Cotê e Villemard imaginaram e retrataram a
escola do ano 2000, num postal que era parte de uma série produzida para a
Exposição Universal de Paris, em 1900.
A gravura é de 1899 e foi utilizada por João Barroso,
especialista em políticas de educação e formação da Universidade de Lisboa, num
trabalho que terá sido apresentado em São Paulo, ontem, intitulado A Escola e o Futuro: As Mudanças Começam na
Sala de Aula.
A escola do ano 2000 é imaginada, no final do século
XIX, como um prolongamento da escola então existente. Cotê e Villemard não
vislumbraram uma sala de aula com um funcionamento completamente diferente por
causa da electricidade. Em vez disso, desenharam a aula de 1899 - um local onde
os jovens recebem, de forma passiva, o conhecimento que lhes é transmitido pelo
professor - e acrescentaram-lhe uma nova tecnologia, que lhes permitiria,
simplesmente, ter a mesma informação, embora com a recepção facilitada.
Vítor Teodoro, professor da Faculdade de Ciências e
Tecnologias da Universidade Nova de Lisboa, tem outra pintura - de uma sala de
aula ainda mais antiga - na cabeça. O professor está num púlpito. Lá no alto,
consegue ver todos os alunos, que se dispõem à sua frente, sentados por filas.
Mas nem todos olham para ele. Uns conversam com os colegas do lado. Uns têm o
olhar perdido noutra direcção. Um deles dorme apoiado no braço. Vítor Teodoro
está a pensar na iluminura pintada por Laurentius de Voltolina no século XIV,
que retrata Henrique da Alemanha a dar uma aula na Universidade de Bolonha, mas
que, de acordo com o professor, podia retratar uma sala de aula dos dias de
hoje.
A educação que hoje conhecemos tem duas bases, explica
o professor da FCT-UNL: a da religião e a do apprenticeship - a aprendizagem por integração numa
comunidade, que vem da tradição dos ofícios e dos mestres. Para Vítor Teodoro,
durante o século XX, predominou o modelo religioso. A escola adoptou das
igrejas o estrado e o púlpito e o professor, à semelhança do padre, começou a
transmitir, expositivamente, a informação aos alunos, que a recebem de uma
forma passiva. Ensina-se o grupo e não o indivíduo, o que, muitas vezes, leva a
que alguns jovens não compreendam o que está a ser ensinado e percam o
interesse: "Há 50 anos, as pessoas repetiam as orações em latim e não
percebiam o que estavam a dizer. Hoje, acontece o mesmo com os alunos."
Há muito tempo que a escola se concentra em ensinar
aos alunos as competências básicas da matemática, da escrita e da leitura.
Agora, estas aprendizagens básicas já não são suficientes. No livro The global achievement gap, Tony
Wagner, investigador de Inovação na Educação no Centro de Tecnologia e
Empreendedorismo da Universidade de Harvard, descreve o que está a ser ensinado
aos jovens nas escolas, por oposição ao que eles deveriam estar a aprender para
triunfarem nas suas carreiras, numa economia global.
Tudo se passa nos mesmos lugares, ao mesmo tempo e da mesma maneira. Uma escola é uma coleção de salas de aula e o ensino é uma repetição de atividades pré-formatadas, iguais todos os anos.
João Barroso - Universidade de Lisboa.
Wagner defende que a escola deve desenvolver sete
"competências de sobrevivência" necessárias para que as crianças
possam enfrentar os desafios futuros: pensamento crítico e capacidade de
resolução de problemas, colaboração, agilidade e adaptabilidade, iniciativa e
empreendedorismo, boa comunicação oral e escrita, capacidade de aceder à
informação e analisá-la e, por fim, curiosidade e imaginação.
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